Ao contrário do que muitos pensam, a ética e a moral são de importância
substancial no pensamento e na vida dos africanos, que são baseadas nos
costumes, em leis tradicionais, tabus e tradições de cada um dos povos da
África. Deus é visto como o derradeiro sancionador e sustentador da moralidade.
O relacionamento humano pelo parentesco e vizinhança é extremamente importante
e a ética e moral tradicionais são construídas, largamente, através das
relações humanas.
Moralidade pode ser resumida, em Yorùbá, pela palavra Ìwà -
caráter. Caráter é a essência da ética africana e sobre ele se estabelece
a vida de uma pessoa. Deus exige que o homem seja puro eticamente. Deus é o
buscador de corações, que a tudo vê e sabe e cujo julgamento é correto e
inevitável. Deus julga os homens por seu comportamento aqui e agora, bem como
no porvir. Dessa forma a paz na vida após a morte é decidida de acordo com a
moral exercida, pelo ser humano, sobre a terra. Mau comportamento pode destruir
o destino de uma pessoa, enquanto bom caráter é uma armadura suficiente contra
o mal e a desgraça.
Os costumes regulam o que deve e o que não deve ser feito. De acordo com
Mbiti: "Roubar, agredir as pessoas, mostrar desrespeito aos mais velhos,
mentir, praticar feitiçaria, dormir com a mulher de alguém, matar, caluniar as
pessoas e assim por diante são consideradas grandes ofensas, que podem ser
severamente punidas pela sociedade através do degredo, indenização, pagamento
de multas, espancamento, apedrejamento e até mesmo a morte. Por outro lado, a
bondade, a cortesia, a generosidade, a hospitalidade, o respeito, a diligência,
a frugalidade e o trabalho duro são aspectos da moral ensinadas às crianças em
várias comunidade africanas, como princípio básico de vida."
(Mbiti, John. Introduction to African Religion. London:Heinemann, 1961)
Os Yorùbá e, na verdade, os africanos têm a moralidade como a essência
que torna a vida alegre e agradável. Para os Yorùbá, segundo Bólájí Ìdòwú, o
bom caráter (ìwà rere) deve ser a mola mestra na vida das pessoas. De fato é
isso que distingue o ser humano dos animais. Quando os Yorùbá dizem de
alguém O şe Ènìyàn (os atos da pessoa), querem dizer que ela
se comporta como deve, ou seja, ela mostra que sua vida e suas relações com os
outros são regrados pelas suas melhores características. A descrição
contrária kìí şe ènìyàn, n şe lof’awon ènìyàn bora (Ele não é
uma pessoa, ele assumiu a pele de uma pessoa). Isso significa que a pessoa é
socialmente indigna; em consequência de sua característica, não está apta a ser
chamada de pessoa, embora tenha a aparência de uma.
Em geral, deve-se dar ênfase a que Deus, as divindades e os antepassados
requerem um bom comportamento dos seres humanos.
Mas podemos perguntar por que as pessoas que seguem a Religião
Tradicional Africana, assim como os seguidores de outras religiões
(cristianismo, islamismo, judaísmo, hinduísmo etc), praticam atos imorais? A
resposta é simples: hoje, muitas pessoas professam uma determinada religião,
porém deixam de agir de acordo com os princípios e os ditames dessa mesma
religião, que é a principal causa para os atos de corrupção, violação dos
Direitos Humanos, péssimas práticas eleitorais, etnicismo, bem como outras
práticas imorais e aéticas.
No entanto, esses problemas não são insuperáveis, basta que as pessoas
façam valer aquilo que aprenderam e unam a religião à moralidade, que são
coisas indissociáveis. Um adágio Yorùbá diz Ìwà l’èsìn, Èsìn ni Ìwà
(religião é uma exibição de moralidade, moralidade é o maior ato de adoração).
Por isso é que os adeptos das diversas religiões devem saber e acatar que
nossos atos de adoração só se tornarão dignos e significativos ao Criador, se
eles forem acompanhados pela ética e pela moral.
Por Mário Filho - Dirigente do Templo Espiritual
Caboclo Pantera Negra. É Bacharel em Ciências Policiais de Segurança e Ordem
Pública, com Especialização em Políticas Públicas de Gestão em Segurança Pública
e Ciências da Religião (ambas pela PUC/SP). É Mestrando em Ciência da Religião
(PUC/SP) e pós-graduando em História da África e do Negro no Brasil
(UCAM/RJ)
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