Sendo Deus amor e
misericórdia, qual não deve ser sua decepção ao ver a obra mais perfeita de sua
criação, o ser humano, a quem dotou de inteligência superior a dos demais seres
vivos e de uma alma imortal com a prerrogativa ainda de poder evoluir através
das reencarnações, cometer verdadeiras atrocidades contra todo o resto que foi
criado? Onde estaria a coerência e a justiça de Deus ao criar os animais para
depois ficar indiferente ao fato de vê-los imolados em seu sacrifício? Como
imaginar a satisfação dos Orixás, desdobramentos da essência Divina e cujos
pontos de força se localizam na própria natureza, recebendo em oferenda a
carne, sangue e vísceras dos mesmos animais que fazem parte da fauna de seus
reinos?
Independente de toda
discussão sobre a liberdade religiosa e do culto da fé sem restrições, é
possível buscar a compreensão para a essência dos rituais que abatem animais em
sacrifício as divindades mas que pelo menos consomem a carne durante a
celebração, dividindo-a e alimentando todos os participantes. São rituais
arraigados em tradições antigas e que tem nestas práticas pontos de
fundamentação religiosa. Muito mais difícil porém é o entendimento do ato de
sacrificar dezenas de animais ou aves e deixá-los expostos em vias
públicas aguardando a putrefação, juntamente com resíduos de papéis, plásticos
e vidro, agredindo a natureza e a sensibilidade de quem não compartilha da
mesma crença. Se a muitos de nós espíritos atrasados isto gera constrangimento e
piedade, o que se dirá dos espíritos de luz a quem justificadamente se oferece
tais sacrifícios alegando-se que os mesmos necessitam desta essência
energética?
Será que um
espírito da falange de Xangô, cujo machado jamais pende para o lado da injustiça,
necessitaria ou teria satisfação em receber em oferenda um animal que teve sua
existência bruscamente interrompida antes de cumprir seu roteiro evolutivo? Que
coerência haveria em imaginar uma falangeira de Oxum, o orixá do amor e da
doçura, se locupletando com a energia do corpo sem vida de um irmão
menor? Ou mesmo um Exu de Lei, cuja escolha foi a de trilhar o caminho da
evolução trabalhando junto a crosta e fazendo o intercâmbio entre os seres
humanos e as energias divinas, será que não veria neste sacrifício em seu nome
um retrocesso na sua jornada evolutiva?
Porém, não podemos
ser hipócritas de condenar tais sacrifícios e depois sentarmos a uma mesa
lotada de iguarias constituídas também de animais abatidos para nosso consumo,
fazendo-o sem peso nenhum na consciência. Não é porque o abate se destina ao
comércio para alimentação das pessoas que deixa de ser mais dantesco aos olhos
do plano espiritual. Esta simplesmente é uma justificativa que convém a nós que
ainda necessitamos dos fluídos animalizados para saciar nossos instintos
atávicos. Mesmo não justificando, o abate para consumo ainda encontra respaldo
na sociedade por se tratar de algo absolutamente atrelado aos hábitos dos seres
humanos e que para serem alterados requerem essencialmente que cada um passe
por uma modificação de consciência, o que certamente requer empenho individual
ou tempo para que haja tal reforma de maneira coletiva.
Imaginar que
diariamente milhões de irmãos necessitados passam fome e morrem em
virtude da falta de alimentos enquanto apodrecem ao ar livre as oferendas
de animais sacrificados e frutas frescas que poderiam minimizar o
sofrimento de muitos espíritos desafortunados, leva a crer que ainda está
havendo uma grande inversão de valores do ponto de vista religioso.
Sacrifica-se para agradar aos espíritos, orixás, deuses ou seja lá qual for a
energia superior visada e muitas vezes não somos capazes de oferecer um prato
de comida ao irmão andrajoso que nos estende a mão suplicante, chegando mesmo a
olhá-lo com desprezo e asco. Basta pensar em termos de preceitos do Evangelho
para concluir qual destas ações teriam mais reconhecimento por parte da força
superior a qual visamos agradar. Realizar ou pactuar da morte de um ser vivo na
tentativa de fazer um escambo com o plano espiritual somente nos compromete
ainda mais aos olhos da Lei Maior.
Há quem justifique
tais rituais com exemplos do Velho Testamento que mostram um Deus rancoroso e
vingativo que exercia sua divindade através do temor que causava nos simples
mortais. Relembremos, porém um trecho do Velho Testamento, Livro do profeta
Isaias, Cap. 1: “Ouvi, céus, e tu ó terra, escuta, é o senhor quem fala: Eu
criei filhos e os eduquei; eles, porém se revoltaram contra mim”. “De que me
serve a mim a multidão das vossas vítimas? Já estou farto de holocaustos de
cordeiros e da gordura de novilhos cevados. Eu não quero sangue de touros e de
bodes”. “De nada serve trazer oferendas; tenho horror da fumaça dos
sacrifícios. As luas novas, os sábados, as reuniões de culto, não posso
suportar a presença do crime na festa religiosa”.
Este mesmo Deus
possibilitou que seu Filho pelo próprio sacrifício voluntário tentasse
atingir os espíritos embrutecidos dos seres encarnados para que o amor ao
próximo e a todas as criaturas vivas pudesse aflorar e que seu Evangelho de
amor pudesse se perpetuar através dos tempos. Infelizmente nossos espíritos
infantis ainda são seletivos em assimilar e vivenciar somente aqueles conceitos
que nos são favoráveis e que não exigem maiores privações, as quais certamente
resultariam em verdadeiras mudanças e no avanço evolutivo.
Fonte:
http://www.triangulodafraternidade.com
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